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“As palavras verdadeiras não são agradáveis, e as
agradáveis não são verdadeiras”.
Lao-Tsé
Há alguns meses, lendo um trecho da obra “O
Mestre Inesquecível”, do médico psiquiatra, psicoterapeuta, escritor e Pós-graduado
em Psicologia Social, Dr. Alberto Cury, foi que descobri o porquê dessa minha
busca que começou lá pelos meus 22 anos de idade. No último parágrafo da página
146 do seu livro, eis o que o Dr. Cury diz:
“O que é inteligência espiritual? É a
inteligência que deriva do conceito consciente ou inconsciente de que a vida
humana é uma grande pergunta em busca de uma grande resposta. É a inteligência
que procura o sentido da vida, mesmo quando a pessoa afirma que não crê”.
E o Dr. Cury prossegue, dizendo que
“inteligência espiritual é a procura por Deus, independentemente de uma
religião, no recôndito do nosso ser, para desfazer os nós do novelo da vida”.
Foi assim, portanto, movido possivelmente por
essa força da inteligência espiritual, que empreendi a jornada em busca das
respostas às perguntas que me inquietavam, e, nessa busca, deparei-me com um
movimento que se ocupava de ler e divulgar uma coleção de livros chamada
“Universo em Desencanto”. Quem me apareceu com a novidade foi o meu falecido
irmão Adilson, de dois anos mais novo que eu, com quem eu, muitas vezes,
debatia sobre a razão da vida, o porquê dessa coisa sem sentido do nascer,
crescer, criar e morrer.
O que me atraiu primeiramente no livro nem
foi tanto o seu conteúdo, mas a forma como era escrito. Imagine alguém narrando
sobre um acontecimento qualquer, tendo ao seu lado alguém gravando a sua fala,
para, depois, transcrever tudo o que foi gravado para texto com rigorosa
fidelidade. Por aí, expressões repetidas, pleonasmos e demais vícios, inadmissíveis
numa obra escrita comum, vão aparecendo no decorrer da leitura, de modo que,
aos olhos daqueles leitores que desconhecem esse método de escrever conforme o
que é ouvido, o texto assume certa particularidade que acaba prendendo a
atenção dos que lêem a obra, ou, melhor dizendo, a coleção de livros,
inicialmente, de 21 volumes. Era desse modo que os textos apareciam: o Sr.
Manoel, que se dizia médium, recebia, de um tal Racional Superior, de forma
supostamente telepática, as mensagens que eram então gravadas por um
assistente. Depois, a gravação era digitada em textos, e estes viravam conteúdo
dos livros. Vejamos o que diz sobre esse movimento a Wikipedia, a enciclopédia
on line dos internautas:
“Universo em
Desencanto é uma obra de 1000 livros com fundamentos
centrados nos conhecimentos da chamada Cultura Racional,
enviadas por uma entidade denominada Racional
Superior, habitante do chamado Mundo
Racional. Esses ensinamentos teriam sido ditados através de seu aparelho, o
Sr. Manoel Jacintho Coelho. Segundo o livro, trata-se de um conhecimento de
retorno da humanidade ao seu "verdadeiro mundo de origem", o Mundo Racional, por meio da uma Energia Racional, que faria a ligação
do ser humano ao Mundo
Racional.”
Nos livros, cuja coleção, em vez de mil,
não chegou sequer a cem, não há, pelos menos nos seus primeiros volumes, nada
relacionado com normas de conduta ou preceitos morais. Basta apenas ler os
livros para, segundo diziam lá alguns adeptos mais adiantados nas leituras, o
sujeito ser imunizado (contra o quê? Ninguém soube responder de forma precisa,
senão com explicações vagas e carregadas de lacunas).
Entusiasmado com aquela novidade, em pouco
tempo, lá estava eu com o meu mano, trajando calça e camiseta branca — esta,
contendo propaganda da crença — perambulando em grupo com outros adeptos da
seita, trajados todos do mesmo modo, com a missão de abordar os transeuntes nas
ruas para exortá-las à leitura da coleção que fala duma tal de “Cultura
Racional”. Na seita, não há templos nem rituais. Há apenas a obrigação de
comprar os livros (sendo proibido tomá-los por empréstimo) e participar das
caravanas de divulgação.
Vez que eu era ainda um calouro naquela
coisa, consegui convencer o mano a emprestar-me os livros, e ele, embora
relutante por causa da proibição que havia naquele movimento quanto a
empréstimos dos exemplares, acabou atendendo-me, e passei então a lê-los até
com alguma avidez.
Estávamos, eu e o meu irmão, cada vez mais
envolvidos com a leitura daqueles livros, quando, ao ver, numa pequena nota jornalística,
a notícia de que estava sendo construído um campo de pouso para discos voadores
— um discódromo ou ovniporto — no sítio onde vivia o Sr. Manoel, o médiun que
recebia telepaticamente aquelas mensagens, surgiu-me a idéia de visitar o lugar
e, se possível, conversar com o tal Manoel.
Convite feito ao mano, convite aceito, e lá fomos a um ponto ermo do Rio
de Janeiro (Estado) chamado Tinguá, onde fica o tal sítio. Àquela altura,
depois de ter lido, na tal obra, uma boa quantidade de absurdos anticientífico,
como, por exemplo, que a lua se inchava e se comprimia conforme a sua
menstruação, eu já andava meio “pé atrás” com aquela coisa, mas, ainda assim,
dispus-me a excursionar até a morada do autor Manoel.
Logo na chegada ao portão, fomos informados
de que não era possível visitar aquele retiro, porque se tratava de residência
particular do escritor. Diante desse argumento poderoso, não restou
alternativa, senão a de iniciarmos a caminhada de retorno. Todavia, se não era
possível entrar, nada nos impedia de andar em torno do sítio; e começamos então
a perambular à volta do mesmo para tentar visualizar uma parte que fosse do
“discódromo”. Foi aí, então, que deparei com um quadro que jogou por terra
aquele meu entusiasmo que, àquela altura, já não era tanto: passarinhos...
dezenas deles, presos
Lastimando o tempo
perdido com as baboseiras publicadas nos livros, dei fim às camisetas da seita,
transformando-as em panos de chão, e tratei de convencer o mano a sair daquilo
— no que, inclusive, tive sucesso — demovendo-o de permanecer naquela
maluquice. Concluí logo que a Verdade não podia estar ali, convivendo com o
egocentrismo e a perversidade contra animais. |
Cap. 3 — A SEITA DO UNIVERSO EM DESENCANTO
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